Como os cachorros perdidos encontram o caminho de volta para casa? Veja o que a ciência descobriu

De vez em quando, o enredo de “A Incrível Jornada”, filme clássico da aventura de dois cachorros e um gatinho (disponível no Disney+) se torna realidade quando um cão perdido percorre uma distância surpreendente para encontrar o caminho de casa.

Em 2015, Georgia May, uma cachorrinha resgatada, fez uma jornada de mais de 56 km para casa depois de fugir durante uma caminhada em San Diego, na Califórnia, Estados Unidos. Laser, um beagle, voltou para sua vizinhança em Winnipeg, em Manitoba no Canadá, em 2010, seis semanas depois de se separar de sua família durante um show de fogos de artifício a 80 Km de distância.

E em 1924, Bobbie, uma mistura de border collie que se separou da família durante uma viagem de carro, voltou de Indiana para Silverton, Oregon (Estados Unidos) – uma jornada de 4500 Km que levou seis meses e atravessou várias cadeias de montanhas.

Então, como os cachorros conseguem realizar viagens tão impressionantes? Segundo os especialistas, eles possuem uma combinação poderosa de instintos de localização e sentidos aguçados.

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Os cães criam um mapa mental

As habilidades de localização dos cães provavelmente foram herdadas de seu ancestral, o lobo cinzento, que percorria grandes extensões de terra na Eurásia, onde os cães foram domesticados pela primeira vez.

Assim como os humanos, “os cães parecem ser capazes de construir mapas mentais de seu ambiente”, disse Zazie Todd, autora do livro “Bark! The Science of Helping Your Anxious, Fearful, or Reactive Dog” (“A ciência de ajudar seu cão ansioso, medroso ou reativo”, em tradução livre). “É provável que seu mapa mental de um ambiente seja um pouco diferente do nosso, pois provavelmente é dominado por aromas.”

Rastrear, ou seguir um rastro de cheiro, é um método que os cães usam para navegar e se orientar em seus arredores. Os cães têm um olfato 10 mil a 100 mil vezes maior do que o nosso, o que lhes dá a capacidade de farejar tudo, desde explosivos até COVID-19 e diabetes. 

Os cães também podem reconhecer pontos de referência familiares por meio da visão, do olfato e do som. Alguns cães provavelmente se orientam reconhecendo a posição relativa de um ponto de referência familiar em relação à sua casa e sua localização atual em relação a esse mesmo ponto de referência, afirma Bridget Schoville, diretora sênior de ciência comportamental de abrigos da ASPCA.

“Usando esses pontos de referência, eles são capazes de percorrer um caminho direto para casa.”

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Calibrando uma bússola interna dos cachorros

Aves migratórias, peixes salmões e baleias são alguns dos animais conhecidos por se conectarem ao campo magnético da Terra, embora os órgãos que controlam a magnetorecepção ainda não sejam bem compreendidos.

Os cachorros também podem ter essa habilidade desconcertante. Para um estudo publicado em 2020, pesquisadores da República Tcheca recrutaram 27 cães de caça para participar de um experimento de três anos. Durante mais de 600 testes de campo, os cientistas colocaram rastreadores GPS e câmeras nos cães antes de soltá-los em uma área de floresta desconhecida. Em seguida, eles rastrearam os animais quando seus donos os chamaram de volta para casa. Todos os cães do estudo correram, em média, quase um quilômetro e meio dentro da floresta.

Quase 60% dos cães do estudo usaram seu olfato para refazer seus passos e farejar o caminho de volta para seus tutores.

Mas outros 30% dos participantes caninos fizeram outra coisa. Esses cães empregaram uma estratégia de reconhecimento, na qual seguiram uma nova rota que começava correndo uma pequena distância ao longo do eixo norte-sul da floresta, independentemente da localização de seu treinador. Sem nenhuma pista visual familiar para usar, os cachorros do estudo provavelmente estavam navegando pelo campo magnético da Terra.

Os pesquisadores apelidaram essa estratégia de “corrida da bússola” e observaram que ela ajudou os animais de teste caninos a encontrar seus humanos muito mais rapidamente do que os cães que usaram apenas o cheiro. Os autores concluem que os cães podem combinar seu mapa mental com o campo magnético para se orientar quando estão perdidos.

“Ainda não encontramos evidências conclusivas de que os cães usaram sinais magnéticos para navegação, mas essa é a explicação mais plausível”, comenta o coautor do estudo Hynek Burda, professor emérito de zoologia da Universidade de Duisberg-Essen, na Alemanha.

Os cachorros também podem combinar esses métodos sensoriais. Embora seguir o faro seja mais lento do que procurar, em alguns casos pode ser mais seguro. “Um cão, como nós ou outros animais que resolvem um problema semelhante, pode usar e alternar entre diferentes estratégias”, diz Burda.

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Lar é onde o cachorro está

No entanto, de modo geral, “a maioria dos cães não tem a possibilidade de aprender, adquirir experiência ou praticar o homing em lugares distantes e desconhecidos”, afirma Burda.

Isso porque essas viagens incríveis estão se tornando menos comuns à medida que as raças modernas de cães são criadas para ficarem próximas de seus donos.

“Os cães criados com humanos podem formar vínculos com eles que são semelhantes aos vínculos entre pais e filhos, e um aspecto fundamental desse tipo de vínculo é uma forte motivação para buscar o reencontro quando separados”, disse Monique Udell, diretora do Laboratório de Interação Humano-Animal da Universidade Estadual do Oregon.

“Quando os cães desaparecem, é uma experiência aterrorizante para eles”, acrescenta Todd, e é por isso que é importante evitar que seu cachorro saia por aí. 

Se um tutor se certificar de que seu cão tem uma boa identificação, como um microchip ou uma coleira com um número de telefone, isso pode facilitar o reencontro do animal com sua família. “Essa é a coisa mais útil que podemos fazer para garantir que o cão não tenha que encontrar o caminho de casa.”