Um segundo asteroide pode ter atingido a Terra durante a extinção dos dinossauros

Possível cratera oculta sob a costa da África Ocidental pode ter sido causada pela queda de uma rocha espacial na Terra na época do impacto cataclísmico na já conhecida cratera de Chicxulub.

Por Maya Wei-Haas
Publicado 18 de ago. de 2022, 17:28 BRT
Esta ilustração mostra o impacto de um  asteroide semelhante ao evento ocorrido há cerca de 66 ...

Esta ilustração mostra o impacto de um  asteroide semelhante ao evento ocorrido há cerca de 66 milhões de anos, que causou a extinção de três quartos das espécies da Terra. Outra cratera de impacto pode ter sido descoberta na costa da África Ocidental, em uma nova reviravolta dessa extinção.

Arte de CLAUS LUNAU Science Source

Em um instante catastrófico há cerca de 66 milhões de anos, o curso da vida na Terra mudou para sempre. Um asteroide de cerca de 10 km de largura atingiu a costa da região onde hoje fica localizada a península de Yucatán, no México, e deu início a um cataclismo global. 

Os gigantescos tsunamis resultantes avançaram por milhares de quilômetros sobre regiões costeiras. Incêndios florestais assolaram vastas extensões terrestres. E a evaporação de rochas ao longo do fundo do mar lançou gases que provocaram oscilações climáticas extremas – tudo isso causou a extinção de cerca de 75% das espécies do planeta, incluindo todos os dinossauros não aviários.

Mas essa pode não ser a história completa. Sob camadas de areia na costa da África Ocidental, há indícios de que a gigantesca rocha espacial não seria a única.

Pesquisadores identificaram uma possível cratera com cerca de 8.5 km de largura, revelada em levantamentos sísmicos do leito oceânico, segundo um novo estudo publicado na revista científica Science Advances. A cratera, batizada de Nadir, em homenagem a um vulcão submarino nas proximidades, parece ter sido esculpida pelo impacto de uma rocha espacial com largura mínima de 400 metros – e pode ter sido formada na mesma época da cratera de Chicxulub, a cicatriz extensa na superfície da Terra deixada pelo asteroide que dizimou os dinossauros.

“Muita gente questiona: como o impacto de Chicxulub — embora enorme – poderia ter tantos efeitos destrutivos em todo o mundo?”, indaga Veronica Bray, autora do estudo, cientista planetária da Universidade do Arizona, nos Estados Unidos. “Pode ser que não tenha sido apenas um asteroide.”

O objeto celeste que originou Nadir teria sido consideravelmente menor que o causador da cratera de Chicxulub. Por isso, seus efeitos provavelmente foram mais localizados. Contudo, se confirmado, a segunda queda de meteorito em um curto intervalo poderia ter sido um golpe duplo na catástrofe global no fim do período Cretáceo, de acordo com o estudo. 

Uma hipótese formulada é que os dois asteroides poderiam ser provenientes de um mesmo corpo celeste original, que se partiu em dois antes de atravessar a atmosfera da Terra e atingir o solo, e se afastaram a uma distância superior a 5 400 km.

Embora sejam necessárias análises adicionais para confirmar a idade e identidade da possível cratera, e se possui relação com Chicxulub, cientistas estão cautelosamente empolgados com o possível novo local de impacto.

O registro de impactos antigos na Terra é lamentavelmente incompleto devido à agitação geológica intensa do planeta. Extensões da superfície são recicladas no manto da Terra, ao passo que outras são refeitas com novas rochas vulcânicas, e outras ainda são erodidas pela movimentação de geleiras. Apenas cerca de 200 crateras de impacto foram confirmadas no planeta, o que impede cientistas de entender completamente como esses impactos afetaram a Terra antiga e que papel podem desempenhar no futuro do planeta.

“A Terra destrói incessantemente crateras de impacto”, afirma Jennifer Anderson, geóloga experimental especializada em crateras de impacto na Universidade Estadual de Winona, nos Estados Unidos, mas que não integrou a equipe do estudo. Devido à atividade geológica do planeta, prossegue ela, “qualquer descoberta de uma nova cratera de impacto na Terra é sempre importante”.

Nova cratera: uma surpresa sísmica

Assim como muitas descobertas, a possível nova cratera foi encontrada por acaso. Uisdean Nicholson, geólogo da Universidade Heriot-Watt, em Edenborough, no Reino Unido, estava interessado em reconstituir a separação entre a América do Sul e a África ocorrida há aproximadamente 100 milhões de anos.

Em busca de vestígios, Nicholson examinou as formações sob o leito oceânico entre os dois continentes, em colaboração com as empresas WesternGico e TGS, para obter dados sísmicos. A análise rastreou ondas sísmicas no subsolo para identificar formações subterrâneas. Quase imediatamente, Nicholson detectou algo incomum.

O especialista em levantamentos sísmicos observou dados referentes a muitas formações, como protuberâncias e cavidades nas estratificações subterrâneas, incluindo cúpulas de sal, que se erguiam através de rochas mais densas circundantes. Mas as oscilações de dados diante dele sugeriam algo mais cataclísmico. “Nunca vi nada parecido”, afirma Nicholson.

Ele procurou outros cientistas, incluindo Bray, para perguntar se acreditavam que poderia ser uma cratera de impacto, e todos concordaram: a formação consiste em uma cavidade cercada por uma borda com um pico proeminente em seu centro, algo comum entre essas crateras.

Ao analisar o formato e a dimensão da estrutura, a equipe desenvolveu modelos de suas possíveis origens. Os resultados sugerem que a cratera tenha sido causada pelo impacto de uma rocha espacial com cerca de 400 metros de largura, que atravessou a atmosfera e atingiu a superfície do mar a cerca de 70 000 km por hora. Ao mergulhar no oceano, observa Bray, “afundou pela água sem nenhuma resistência”.

A colisão teria desencadeado a energia de 5 000 megatoneladas de TNT, estima a equipe, evaporando quase instantaneamente a água e as camadas do fundo do mar abaixo. Em seguida, uma onda de choque teria varrido a superfície, fazendo com que rochas sólidas escorressem como líquido. Em poucos minutos, o leito oceânico teria se elevado, formando um pico central e depois desmoronado sobre si mesmo. O resultado seria um monte no meio de uma depressão côncava – exatamente o que os cientistas acreditam estar enterrado na costa oeste da África.

Ao correlacionar as camadas de sedimentos dessa região com amostras datadas de outros locais, os pesquisadores estimaram que a formação se originou há cerca de 66 milhões de anos – idade incrivelmente semelhante à cratera de Chicxulub.

Dois asteroides?

Estudar as consequências ambientais do fenômeno causador de Nadir pode ajudar a compreender melhor o que impactos futuros podem causar ao nosso planeta. O suposto causador de Nadir teria dimensão comparável ao asteroide Bennu, que tem uma chance em 1 750 de colidir com a Terra nos próximos três séculos, tornando-o um dos asteroides mais propensos a atingir nosso planeta. 

Tal evento estaria longe de ser insignificante, provocando tsunamis por centenas de quilômetros. Ou, nas palavras de Bray: “É grande o suficiente para destruir uma ou duas cidades.”

Mas não se sabe ao certo as repercussões dessa descoberta para nossa compreensão dos fenômenos ocorridos imediatamente após o impacto de Chicxulub e do fim da era dos dinossauros. A energia liberada pelo impacto de Nadir e suas consequências ambientais teriam sido ofuscadas pela colisão do asteroide Chicxulub, de 10 km de largura, com a Terra e o cataclismo global que se seguiu.

“É uma magnitude completamente diferente”, afirma Martin Schmieder, especialista em estruturas de grandes impactos da Universidade de Ciências Aplicadas de Neu-Ulm, na Alemanha, que analisou o estudo antes de sua publicação.

Mas o impacto de Nadir poderia ter “agravado a destruição” de um ecossistema já devastado, comenta Bray. É preciso ainda saber se houve outros impactos nesse mesmo período. Os autores do estudo observam que, com 65,4 milhões de anos, a cratera de impacto Boltysh, na Ucrânia, é um pouco mais recente do que Chicxulub.

Conjuntos de colisões de fragmentos de cometas ou asteroides foram documentados anteriormente na Terra e em outros planetas. Por exemplo, perto da residência de Anderson, no meio-oeste dos Estados Unidos, três crateras datam de aproximadamente 460 milhões de anos. 

Fizeram parte de um pico de impactos durante o período Ordoviciano, associados por cientistas a uma possível colisão no cinturão de asteroides que lançou um sucessão de meteoritos em direção a nosso planeta ao longo de milhões de anos.

No entanto, identificar os sinais desses impactos na história esporádica de colisões antigas da Terra representa um desafio. Estima-se que um impacto do tamanho de Nadir ocorra a intervalos um pouco menores de 100 mil anos, afirma Schmieder. “Então, basicamente podem ocorrer a qualquer momento.”

E em relação à própria Nadir, mais estudos serão necessários para determinar como se formou.

“É uma descoberta impressionante”, escreveu por e-mail Gareth Collins, cientista planetário especializado em crateras de impacto da Imperial College de Londres, no Reino Unido, embora ressalte que ainda não há muitas conclusões decorrentes da descoberta. É necessário coletar amostras diretamente para confirmar a origem da formação e obter datas mais precisas sobre o possível impacto que a causou.

Os autores do estudo já solicitaram verbas de emergência para perfurar a formação de Nadir e coletar amostras da rocha da cratera que possivelmente sofreu o impacto, derreteu e se fundiu a outros materiais, bem como das camadas de sedimentos acima dela. O espessamento do leito de areia e lodo sobre a estrutura enterrada pode ter preservado as características da cratera e ainda poderia ajudar a revelar o estado da vida oceânica nos anos posteriores ao impacto – oferecendo diversos dados novos sobre as consequências de colisões de asteroides com nosso planeta.

“Mas, evidentemente”, observa Bray, “só será possível saber ao certo após perfurar”.

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