Ilha de Páscoa: estátuas continuam em risco após incêndio

Incêndios recentes destruíram o patrimônio, causando danos “irreparáveis” a centenas de moais sagrados de Rapa Nui.

Centenas de estátuas, ou moai, espalhadas na Ilha de Páscoa, conhecida pelos moradores locais como Rapa Nui. A maioria dos moais circunda a ilha de costas para o mar, mas muitos ainda se encontram na pedreira de Rano Raraku, vista aqui, onde foram esculpidas em pedra vulcânica.

Foto de Susan Seubert
Por Allie Yang
Publicado 27 de out. de 2022, 11:30 BRT

A Ilha de Páscoa, um dos locais habitados mais remotos da Terra, é famosa pelas cerca de mil estátuas enigmáticas e imponentes que compõem sua paisagem, chamadas moai.

No início deste mês, um incêndio causou “danos irreparáveis” a centenas de moais, de acordo com o governo local da ilha, conhecida pelos locais como Rapa Nui. As autoridades determinaram que o fogo começou debaixo da terra.

Embora o verdadeiro impacto ainda esteja sendo avaliado, este desastre é apenas uma das muitas ameaças que enfrentam as estátuas sagradas – junto com as mudanças climáticas e as atividades humanas. Para o povo rapa nui, os riscos são profundos, diz a arqueóloga Jo Anne Van Tilburg, diretora do Projeto Estátua da Ilha de Páscoa.

“Eles valorizam a memória dos antepassados”, destaca. “Eles odeiam ter perdido tanto sem mesmo ser culpáveis". 

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    À esquerda: No alto:

    Existem monólitos semelhantes que foram encontrados em toda a Polinésia, mesmo assim, as estátuas de Rapa Nui são únicas em seu tamanho e rostos solenes.

    À direita: Acima:

    Uma teoria de como os moais foram transportados é semelhante a como os megalíticos foram movidos em Stonehenge: trabalhadores carregaram as enormes estátuas em trenós de madeira, que rolavam pela terra em troncos de árvores.

    fotos de Susan Seubert

    Muito do conhecimento sobre a história e as tradições do povo rapa nui se perdeu no decorrer do tempo. Mas ainda há muita informação sobre as estátuas e a cultura que as construiu – e como elas podem ser protegidas no futuro.

    O que são e quem construiu os moais?

    Segundo a última contagem na ilha, existem 1043 moais completos, enormes estátuas com cabeças proeminentes feitas de pedra vulcânica. Ao contrário da crença popular, eles não são apenas cabeças – também têm torsos, embora muitos estejam parcial ou completamente enterrados. Eles têm cerca de 4 metros de altura e pesam 10 toneladas.

    A maioria das estátuas fica de costas para o mar, em plataformas de pedra chamadas ahu, que contém até 15 estátuas. Alguns moais foram adornados em suas cabeças com pedras vermelhas cilíndricas chamadas pukao, o que representa um topete de cabelo.

    Mas o verdadeiro número de moais na ilha é desconhecido porque muitos permanecem enterrados na pedreira Rano Raraku, na costa sul da ilha, onde as estátuas foram construídas. O maior moai descoberto, chamado “El Gigante”, permaneceu sempre em Rano Raraku – tem 20 metros de altura e um peso estimado de 200 toneladas.

    Essas estátuas foram erguidas centenas de anos antes da chegada do primeiro europeu à ilha, no domingo de Páscoa de 1722. Van Tilburg acredita que os polinésios descobriram a ilha por volta de 1000 d.C. e desenvolveram sistemas sociais, políticos e religiosos avançados que produziram os nobres moais.

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      Rapa nui foi desmatada com a chegada do primeiro europeu, em 1722. Evidências mostram que os povos indígenas da ilha foram capazes de se adaptar construindo sistemas agrícolas resilientes.

      Foto de Susan Seubert

      As estátuas mais antigas encontradas na ilha remontam a 1300, e as mais novas datam do final de 1500 ou início de 1600.

      Por que foram construídos os moais?

      O povo rapa nui acreditava que seus caciques descendiam dos deuses e que, após a morte, eles se tornariam novamente divinos. As estátuas foram construídas para conter temporariamente os espíritos de seus ancestrais. Os ahu, onde se encontram, eram locais de rituais de morte – e em alguns deles, as escavações descobriram restos humanos, cremados e enterrados.

      “Na minha teoria pessoal [os moais] são recipientes onde esses espíritos em movimento podem ser capturados e conservados de maneira segura para continuar ajudando as pessoas que morreram”, acredita Van Tilburg.

      Há uma conexão clara entre os moais de Rapa Nui e monólitos semelhantes encontrados ao redor da Polinésia. Especialistas acreditam que essas estátuas vieram de uma religião comum – mesmo que nem sempre fossem parecidas.

      “Os contêineres no Havaí, por exemplo, são bastante ferozes. Seus rostos estão torcidos e virados de raiva”, diz Van Tilburg. “Só a escultura de Rapa Nui nos diz que é 100% humana”.

      Ainda hoje, eles são considerados sagrados e uma fonte de força de vida espiritual, ou maná. Tocá-los é ilegal.

      Como foram construídos os moais?

      O povo rapa nui esculpiu o moai diretamente de tufo vulcânico, uma pedra porosa feita de cinzas solidificadas, em Rano Raraku, um vulcão extinto.

      Os escultores das estátuas eram considerados mestres artesãos e homenageados por seu trabalho. Seu processo era incrivelmente secreto, pontua Van Tilburg, e os escultores tomaram muito cuidado para não ofender os espíritos durante a construção.

      Acredita-se que os escultores começaram a trabalhar na frente e nas laterais de uma estátua e depois separaram gradualmente a parte de trás da rocha da pedreira. A estátua seria então movida para baixo e colocada verticalmente em um buraco, onde os escultores terminariam suas costas e adicionariam petróglifos à sua superfície. Com isso, a estátua estaria completa.

      O que aconteceu com as pessoas que construíram os moais?

      À medida que a população crescia, os abundantes recursos da ilha foram rapidamente esgotados. Quando o primeiro europeu chegou à ilha em 1700, a ilha foi desmatada, provavelmente para dar espaço para plantações. Sem árvores, as pessoas tentaram se adaptar: as evidências mostram que houve esforços isolados para reflorestar a ilha, diz Van Tilburg.

      Os rapa nui também migraram dentro da ilha, tanto para o interior quanto para a costa. No interior, os agricultores criaram sistemas avançados para cultivos como inhame e batata-doce, que os protegeram de ventos fortes, flutuações de temperatura e rápida evaporação, de acordo com a arqueóloga Mara Mulrooney, que estuda o uso da terra rapa nui.

      Mas a colonização, o comércio de escravos e várias epidemias fizeram estragos. Em 1877, a população da ilha diminuiu para apenas 111. Com o tempo se recuperou, com cerca de 2000 nativos morando atualmente. Mesmo assim, ainda existem ameaças à própria ilha.

      Qual é o impacto humano nos moais?

      A grande maioria dos moai se encontra na margem da ilha, que é imediatamente vulnerável ao aumento do nível do mar causado pelas mudanças climáticas e pela erosão costeira. Os rapa nui previram isso séculos atrás e construíram paredes marítimas, algumas das quais estão desmoronando e precisam ser reforçadas, diz Van Tilburg.

      Van Tilburg diz que o povo rapa nui tradicionalmente tem sido responsável por essa manutenção: “era responsabilidade do grupo realizar tarefas sazonais que protegessem seus locais – eles deveriam capiná-los antes das cerimônias, consertar a parede."

      Mas, nos últimos anos, tem sido difícil reunir o apoio financeiro para esses reparos, principalmente em meio a debates sobre jurisdição entre comunidades locais, famílias privadas e o governo chileno. 

      Qual foi o impacto do fogo nos moais?

      No incêndio de outubro, centenas de moais foram danificados, principalmente ao redor da pedreira Rano Raraku.

      Fotografias do moais mostram maiores danos na superfície do que já foram vistos em incêndios anteriores, ressalta Van Tilburg, o que pode indicar rachaduras no interior da pedra. Segundo ela, se for esse o caso, chuvas fortes podem provocar desmoronamento da pedra.

      “No momento, é impossível conhecer os danos das partes das estátuas que se encontram acima do solo”, diz ela.

      Mas, com as restrições da pandemia impedindo a chegada de visitantes à ilha, o mundo deve esperar para conhecer a verdadeira extensão dos danos.

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