A menstruação no Egito Antigo: egípcios usavam papiro e outras alternativas para lidar com a regra menstrual ao longo dos anos

A forma como lidamos com os períodos menstruais ao longo dos milênios diz muito sobre nossas sociedades e sobre o estigma ainda persistente que envolve a menstruação.

Por Jude Coleman
Publicado 13 de dez. de 2023, 08:00 BRT

Um hieroglifo de arenito datado de 2250 a.C. mostra a deusa Ísis, seu filho e o deus Hathor. Há evidências de que as mulheres egípcias usavam papiro para controlar seu fluxo menstrual.

Foto de Leemage, Corbis, Getty Images

No antigo Egito, as pessoas usavam papiro amolecido (uma planta semelhante à grama) para absorver o sangue menstrual – uma espécie de “tampão” antigo. O registro histórico mais antigo do controle da menstruação é também um dos poucos conhecidos, talvez porque a menstruação tenha sido um assunto tabu por muito tempo, dizem os especialistas.

Como as histórias escritas que fazem referência à menstruação são muito limitadas, as histórias orais são algumas das únicas fontes disponíveis, como os relatos das comunidades indígenas, diz Alma Gottlieb, antropóloga cultural da Universidade de Illinois, nos Estados Unidos. Além disso, os produtos que as pessoas provavelmente usavam para controlar o fluxo sanguíneo eram materiais orgânicos, o que significa que os artefatos se degradaram com o tempo.

Em última análise, dizem os especialistas, as pessoas recorriam ao que estivesse disponível e fosse compatível com suas roupas. Para muitos, isso significava longas tiras de trapos de pano, que podiam ser dobradas e presas às roupas, depois lavadas e reutilizadas. Essa prática é a origem da expressão popular "on the rag", diz Sharra Vostral, historiadora de menstruação e produtos menstruais da Northwestern University, no Illinois.

"Como a menstruação é vivenciada e por quem, e as atitudes sociais em torno dela são diferentes em lugares variados e em épocas diferentes", diz Vostral. Por exemplo, no final do século 19alguns médicos norte-americanos acreditavam que a menstruação era uma doença. Um médico, Edward Clark, acreditava que ir à escola durante a menstruação prejudicava o desenvolvimento dos órgãos reprodutivos. 

A matéria vegetal absorvente, como musgo ou casca de árvore, também poderia ter sido útil, quando disponível. Embora haja rumores de que alguns vikings possam ter usado musgo de pântano, por exemplo, isso não foi confirmado por registros históricos. 

Algumas teorias sobre cuidados de época circulam na Internet, mas, na verdade, "a maioria delas é mentira", afirma Kate Clancy, antropóloga da Universidade de Illinois, especialmente porque é difícil provar métodos especulados de cuidados de época.

Outra opção era sangrar livremente nas roupas. Durante séculos na Europa e nos Estados Unidos, por exemplo, muitas camadas de roupas, como camisetas e vestidos, absorviam o sangue. 

Por volta do final do século 19, surgiu um dispositivo semelhante a uma cinta-liga. Feitas com um cós elástico, as cintas tinham presilhas na frente e atrás para prender um pano.

Pode ter sido útil na transição para roupas mais ajustadas, em vez de saias enormes, mas não eram ainda ótimas opções, diz Vostral. "As pessoas realmente estavam interessadas em algo que fosse melhor."

Mitos sobre a menstruação

Há muito tempo, muitas culturas vêem a menstruação de forma negativa. A falta de compreensão alimentou essas perspectivas. 

Veja a teoria humoral: na Idade Média, acreditava-se que o corpo era composto por quatro componentes líquidos chamados “humores”: sanguebile amarelabile negra e fleuma. Esses fluidos corporais tinham de permanecer em equilíbrio para manter a saúde. 

A perda mensal de sangue da menstruação era fundamental para estabilizar os humores, já que as mulheres eram consideradas mais fracas e incapazes de manter seus humores sob controle, explica Rachael Gillibrand, historiadora da Universidade de Leeds, no Reino Unido.

Essa crença persistiu até a Era Vitoriana, diz ela. Outras percepções imprecisas incluíam a ideia de que as pessoas menstruadas emitiam uma toxina e poderiam causar doenças, que o sangue era “impuro” e, até mesmo, que o sangue poderia acabar com as plantações agrícolas.

preconceito contra a menstruação também pode ser rastreado até a Bíblia. Diz-se que Eva desobedeceu a um deus monoteísta e foi punida com a maldição do parto doloroso. Mais tarde, a visão sobre essa maldição foi ampliada para incluir a menstruação.

"Práticas e percepções menstruais discriminatórias têm sido praticadas desde o início da civilização", afirma Radha Paudel, fundadora da Global South Coalition for Dignified Menstruation no Nepal. 

Esses estigmas criaram um sentimento de vergonha e, mesmo no início do século 20, as pessoas nas culturas ocidentais falavam tão pouco sobre menstruação que muitas adolescentes não tinham ideia do que estava acontecendo com elas, diz Camilla Røstvik, que estuda a cultura menstrual na Universidade de Agder, na Noruega.

"Muitas delas pensaram que estavam morrendo", diz Røstvik, "Se pensarmos no passado, isso deve ter sido muito traumático para muitas crianças em particular."

A vergonha persiste

Por volta de 1930, nos Estados Unidos, os anúncios de alguns dos primeiros absorventes modernos vinham com um cupom que os compradores podiam entregar aos farmacêuticos sem precisar falar. A atitude de silêncio e vergonha é verdadeira em muitas partes do mundo, diz Paudel, que passou décadas pesquisando as percepções da menstruação em culturas do Sri Lanka ao Canadá.

Mas é importante observar que nem todas as culturas vilanizavam a menstruação, diz Clancy. O povo Beng da África Ocidental, por exemplo, trata o sangue menstrual como sagrado e reconhece sua importância na reprodução.

Por outro lado, o povo Rungus do norte de Bornéu vê a menstruação de forma neutra: nem sagrada nem amaldiçoada. As pessoas dessa comunidade administram seu fluxo menstrual colocando-se sobre uma abertura no piso de ripas de suas casas, sangrando livremente sobre a exuberante vegetação da floresta abaixo. "É um processo muito casual, natural", conta Gottlieb.

Atualmente, os produtos comerciais evoluíram para incluir mais métodos de controle interno, como tampões, copos menstruais e discos menstruais.

Mas Clancy ressalta que ainda há um foco significativo em esconder a menstruação e não o suficiente em outros tópicos, como os sintomas que acompanham a menstruação. Embora as cólicas debilitantes possam atrapalhar a vida cotidiana de uma pessoa, por exemplo, isso é pouco discutido.

"Para mim, isso mostra que ainda existe um grande estigma", afirma Clancy.

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