Bolsonaro prometeu explorar os recursos da Amazônia – mas ele pode fazer isso?

O presidente eleito quer extrair as riquezas da floresta equatorial, despertando receio entre ambientalistas e comunidades indígenas. O medo é justificado?

Por Scott Wallace
Publicado 1 de nov. de 2018, 06:35 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT

A vitória do candidato de extrema direita Jair Bolsonaro na eleição presidencial do Brasil no domingo deixou em alerta comunidades indígenas e ambientalistas sobre o destino da floresta equatorial da Amazônia. 

Ativistas e líderes indígenas estão particularmente preocupados com as promessas de campanha de Bolsonaro de reduzir as proteções da floresta equatorial e os direitos dos índios. Ainda assim, algumas especialistas argumentam que há limites para a extensão em que Bolsonaro poderá cumprir suas promessas, sugerindo talvez um futuro mais moderado.

(Conheca mais: O que é a Amazônia Legal?

“Estamos muito preocupados com as declarações do presidente eleito”, afirma Beto Marubo, líder indígena da Terra Indígena do Vale do Javari, no extremo oeste do Amazonas. “Se as promessas dele se concretizarem, haverá caos e uma reviravolta na Amazônia.”

Estão circulando rumores de que a vitória de Bolsonaro já insuflou um sentimento de impunidade em grupos criminosos que praticam o tráfico de madeira, espécies exóticas e outras riquezas roubadas de terras indígenas. “Muitos irmãos nos contam que há invasões, pessoas que entram nos territórios sem respeitar as regras e sem medo das autoridades”, contou Beto Marubo à National Geographic em uma mensagem de WhatsApp de Brasília.

Os dois órgãos federais na linha de frente da proteção da Amazônia são a Funai, órgão indigenista oficial, e o IBAMA, o braço do executivo do Ministério do Meio Ambiente. O destino de ambas as organizações permanece incerto. O que parece certo é que seus orçamentos, já severamente cortados no governo que está saindo, sofrerão ainda mais reduções – talvez debilitantes – sob o governo de Bolsonaro.

“Bolsonaro tem um discurso antiecológico muito forte e não tenho dúvida de que esse discurso ditará sua política”, afirma Scott Mainwaring, especialista em estudos do Brasil da Escola Kennedy da Universidade de Harvard. “Não vejo esse governo dizendo a proprietários de terras para não desmatar uma parte da floresta por estar localizada em terra indígena. Ao que parece, não haverá nenhum grande empenho em favor da proteção da Amazônia.”

Governo de coalisão

Nem todos os especialistas ambientais encaram a vitória de Bolsonaro como uma catástrofe total. “É importante distinguir a retórica de campanha dirigida por Bolsonaro a sua base eleitoral e os acordos que ele deve fazer com sua coalizão no congresso”, explica Eduardo Viola, professor de relações internacionais da Universidade de Brasília e coautor do artigo O regime internacional de mudança climática e o Brasil. Viola afirma que seria “praticamente impossível” para o novo presidente cumprir sua promessa de campanha de tirar o Brasil do Acordo de Paris sobre as alterações climáticas. “Ao contrário dos Estados Unidos, o Acordo de Paris foi ratificado quase unanimemente pelo congresso brasileiro.”

Agora, se o governo de Bolsonaro cumprirá os compromissos de Paris de reduzir o desmatamento e limitar as emissões de gases causadores do efeito estufa é uma questão totalmente diferente. As taxas de desmatamento no Brasil aumentaram nos últimos cinco anos. O Brasil precisaria cortar dois terços de sua atual taxa de desmatamento anual de 7 mil km2 para cumprir suas obrigações de Paris.

É claro que isso não vai acontecer, lamenta Viola. Contudo ele acredita que a pressão internacional contribuirá para evitar um crescimento ainda maior da taxa de perda de floresta. Produtores rurais brasileiros, como pecuaristas e produtores de soja, “entendem que uma imagem negativa do Brasil em relação à Amazônia e às mudanças climáticas prejudicaria as exportações brasileiras.”

Preocupações dos índios

Esse é um leve consolo para os ativistas dos direitos dos índios. Eles temem que os planos declarados de Bolsonaro de extrair as riquezas da Amazônia – seja com a expansão da agricultura sobre terras indígenas, a construção de estradas e outros projetos de infraestrutura ou ainda com a autorização da mineração em terras públicas – desencadeará uma onda de violência e devastação ambiental.

“Todas as comunidades indígenas estão receosas no momento”, conta Felipe Milanez, professor de Humanidades da Universidade Federal da Bahia. “Há um risco de ataque violento brutal.” Milanez teme que sejam banidos e perseguidos os esforços indígenas para patrulhar e proteger suas próprias terras contra invasores, como os guardiões da Amazônia recentemente abordados pela revista National Geographic Brasil.

“O projeto econômico dele é destruir a Amazônia para transformá-la em commodities para exportação”, conta Milanez.

É uma perspectiva que se traduz em um mau presságio para as populações indígenas do Brasil. “Cientistas demonstraram que as terras onde vivem os índios possuem as florestas mais intactas e protegidas”, afirma o líder indígena Marubo. “É porque, para nós, terra é vida. Nossa terra não está à venda. Não pode ser alugada. Sem terra, não existe vida.”

Scott Wallace sobre os povos indígenas isolados da Amazônia na edição de outubro da revista National Geographic Brasil.

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