
Dia Mundial do Cérebro: será que seu cérebro pode ser “mais velho” do que a sua idade?
Dois estudos inovadores mostram que medir a rapidez com que seu cérebro está envelhecendo pode transformar a forma como prevemos e evitamos doenças, mesmo antes do aparecimento dos sintomas.
A velhice chega para todos, mas a rapidez com que ela acontece – e a saúde que você mantém quando ela chega – pode variar drasticamente.
Neste Dia Mundial do Cérebro, em 22 de julho, data instituída pela Federação Mundial de Neurologia para conscientizar e promover a saúde do cérebro, conheça uma pesquisa inovadora que torna mais fácil do que nunca determinar a rapidez com que seu cérebro está envelhecendo.
O novo estudo mostra que ter um cérebro “velho” aumenta o risco de morte em impressionantes 182% em cerca de 15 anos em comparação com pessoas cujos cérebros estão envelhecendo normalmente.
No primeiro de dois estudos recentes, os cientistas da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, descobriram que as pessoas com órgãos biologicamente mais jovens tinham um risco significativamente menor de desenvolver doenças em comparação com aquelas com órgãos mais velhos. Isso foi particularmente verdadeiro para o cérebro: além de aumentar o risco de morte, ter um cérebro mais velho triplicou o risco de demência.
A equipe de pesquisa de Stanford fez essas descobertas usando um exame de sangue baseado em biomarcadores de proteínas, que os ajudou a estimar a idade biológica de órgãos específicos do corpo – uma medida que, ao contrário da idade cronológica, capta a verdadeira condição dos órgãos.
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Mas eles não são os únicos que estão fazendo avanços nessa área. Em um estudo complementar, pesquisadores da Duke University, nos Estados Unidos e da University of Otago, na Nova Zelândia, mostram que um único exame de ressonância magnética, uma tecnologia já comum em hospitais e clínicas, pode ser usado para prever o envelhecimento biológico do cérebro com surpreendente precisão.
Juntos, esses estudos podem revolucionar a forma como cientistas e médicos preveem e previnem doenças crônicas muito antes de elas surgirem.
“Em vez de tratar cada doença uma a uma depois que as pessoas as contraem, queremos abordar a medicina de uma maneira completamente diferente e intervir enquanto as pessoas ainda são jovens e antes que as doenças relacionadas à idade se desenvolvam”, explica Terrie Moffitt, coautora do estudo Duke/Otago e professora de psicologia e neurociência na Duke University School of Medicine.

Uma ilustração mostrando um cérebro e como pode ser uma onda de dopamina.
Como a idade biológica afeta sua saúde
Um dos principais benefícios de um relógio de envelhecimento bem projetado são vários, mas especialmente é poder revelar por que determinados órgãos envelhecem mais rapidamente e como mantê-los jovens pode aumentar a longevidade e a qualidade de vida.
Por exemplo, o estudo de Stanford, publicado em 9 de julho de 2025 na revista científica Nature Medicine, avaliou o envelhecimento biológico de 11 sistemas de órgãos principais – incluindo o cérebro, o coração e os rins – e mostra ligações claras entre a idade biológica e os resultados de saúde. Especificamente, os órgãos mais velhos previam doenças, enquanto os biologicamente mais jovens eram protetores.
Para chegar a essas conclusões, Wyss-Coray e sua equipe analisaram mais de 3 mil proteínas em amostras de sangue de mais de 45 mil pessoas. Usando o aprendizado de máquina, eles desenvolveram um algoritmo com os dados para estimar a idade biológica de cada sistema de órgãos, tudo a partir de uma única amostra de sangue.
Cada “relógio de órgão”, como Wyss-Coray os chama, mostra o quanto um órgão é mais velho ou mais novo em comparação com a idade cronológica de uma pessoa. “O que é fascinante em nossa pesquisa é que as pessoas com órgãos mais velhos têm maior probabilidade de desenvolver doenças nesses órgãos”, explica ele.
Por exemplo, os dados de proteína do sangue mostraram que um coração anormalmente envelhecido previa um risco maior de fibrilação atrial e insuficiência cardíaca. Já pulmões envelhecidos estavam ligados a um risco maior de DPOC. E um cérebro envelhecido aumentava drasticamente a probabilidade de demência.
De fato, alguém com um cérebro biologicamente velho tinha cerca de 12 vezes mais chances de desenvolver Alzheimer na década seguinte, em comparação com colegas com cérebros biologicamente jovens.
Por outro lado, cérebros e corações biologicamente mais jovens foram associados ao aumento da longevidade. O mais impressionante é que o estudo descobriu que ter um cérebro “jovem” reduz o risco de morte em até 40%.
Embora o estudo tenha tido limitações – incluindo um recorte principalmente de brancos e um painel de proteínas limitado – ele mostra que os níveis de proteína, ao contrário dos dados genéticos, podem mudar com o tempo.
Isso abre a porta para intervenções médicas mais personalizadas. Se os médicos puderem determinar quais órgãos estão envelhecendo rapidamente, eles poderão retardar (ou até mesmo reverter) esse declínio com um tratamento direcionado.
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Um relógio de envelhecimento mais acessível
Embora o teste de Stanford tenha sido patenteado e licenciado para uma empresa de biotecnologia na esperança de torná-lo clinicamente útil, pode levar anos até que esteja amplamente disponível em hospitais e consultórios médicos.
Por outro lado, o estudo da Duke/Otago usa tecnologia de ressonância magnética que já é comum em muitos ambientes clínicos. Publicado em 1º de julho de 2025 na revista científica Nature Aging, o estudo se concentra no DunedinPACNI – um biomarcador baseado em algoritmo desenvolvido pela equipe que estima a rapidez com que uma pessoa está envelhecendo usando exames cerebrais padrão chamados de ressonância magnética.
“A partir de uma única varredura cerebral, os pesquisadores agora podem estimar a rapidez com que você está envelhecendo para prever o risco de doenças.”
“A partir de uma única varredura cerebral, os pesquisadores agora podem estimar a rapidez com que você está envelhecendo para prever o risco de doenças”, afirma Ethan Whitman, um dos principais autores do estudo e candidato a Ph.D. em psicologia clínica na Duke University.
O algoritmo foi desenvolvido usando mais de 50 mil ressonâncias magnéticas do cérebro em quatro conjuntos de dados e dados longitudinais do famoso estudo Dunedin – com um recorte raro de 1037 indivíduos nascidos em 1972 e 1973 na Nova Zelândia e acompanhados por décadas.
Esse relógio de envelhecimento identifica os principais marcadores estruturais – como afinamento cortical, encolhimento do hipocampo (alterações que têm sido associadas à perda de memória e demência) e outros padrões de atrofia específicos da região – para estimar a deterioração do cérebro e o declínio cognitivo. De forma crítica, ele faz isso isolando o envelhecimento biológico das influências geracionais.
“A maioria dos relógios de envelhecimento baseia-se em comparações entre pessoas jovens e idosas, o que pode confundir o envelhecimento com exposições geracionais, como fumaça de cigarro ou gasolina com chumbo”, explica Whitman. “Como os participantes do nosso estudo nasceram todos no mesmo ano, pudemos nos concentrar apenas no envelhecimento biológico.”
Melhor ainda, a ferramenta realiza tudo isso de forma mais rápida e precisa do que as medidas anteriores e menos acessíveis.
Essas descobertas podem ser um divisor de águas para estudos clínicos e médicos que trabalham para detectar doenças relacionadas ao cérebro mais cedo. “O DunedinPACNI poderia ser usado como uma ferramenta de medição em estudos clínicos ou como uma ferramenta de triagem para ajudar os médicos a identificar pacientes com maior risco de declínio cognitivo”, diz Hariri.
De fato, uma medida irmã do algoritmo, conhecida como DunedinPACE, já previu o risco de doença em populações dos Estados Unidos, Reino Unido e América Latina, mesmo antes do aparecimento dos sintomas.
Por enquanto, a ferramenta continua sendo uma medida relativa – comparando indivíduos a outros no mesmo conjunto de dados – mas normas de referência estão sendo desenvolvidas para uso mais amplo.
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O futuro da medicina personalizada?
Juntos, esses dois estudos representam um salto para a medicina personalizada.
Embora os estudos tenham sido realizados de forma independente, as duas equipes de pesquisa analisaram e elogiaram o trabalho uma da outra. Kristine Yaffe, diretora do Center for Population Brain Health da Universidade da Califórnia, em São Francisco (Estados Unidos), que não participou de nenhum dos estudos, também analisou os dois estudos e os considera de alta qualidade, em larga escala e altamente complementares.
Wyss-Coray descreve a pesquisa da Duke/Otago como “uma abordagem muito poderosa para criar modelos melhores, obter mais informações biológicas e fazer melhores previsões de saúde e doença”.
Whitman, por sua vez, chama a pesquisa de Stanford de “um excelente estudo que avança a nossa compreensão do envelhecimento e de como medi-lo”. Mas é a combinação de ambas as abordagens que pode oferecer a maior promessa.
“Ao usar os dois tipos de medidas, é possível identificar o risco geral de doenças crônicas de uma pessoa e também detectar um risco exclusivamente maior de doenças específicas de um órgão – é como saber não apenas a velocidade do seu carro, mas quais peças podem estar se desgastando mais rapidamente”, explica Hariri.
“É empolgante prever um futuro em que uma simples gota de sangue ou um exame de ressonância magnética possa ajudar a orientar intervenções personalizadas (como mudanças no estilo de vida ou medicamentos) e acompanhar sua eficácia ao longo do tempo”, afirma Wyss-Coray.
E isso é importante porque nenhuma medida isolada “pode contar a história completa”, diz Whitman. “Os médicos do futuro precisarão de várias ferramentas que ofereçam percepções exclusivas sobre como estamos envelhecendo e como podemos nos manter saudáveis por mais tempo.”
