Descoberto um peixe pré-histórico que vivia de arrancar a carne de suas vítimas
Espécies recém-descobertas de lampreias antigas, que tinham ventosas afiadas no lugar da boca, estão ajudando a reconstruir a história evolutiva desses parasitas escorregadios.

Fósseis de grandes lampreias do período Jurássico, encontradas na China, revelam os primórdios desses parasitas marinhos com boca em forma de ventosa.
As lampreias se alimentam de carne e sangue desde os primórdios da pré-história. Essas criaturas sem mandíbulas, parecidas com enguias, têm discos sugadores revestidos de dentes na boca, que muitas espécies modernas usam para se prender às presas e sugar o sangue de seus hospedeiros vivos.
Recentemente, fósseis impressionantes da China revelaram um par de grandes espécies fósseis de lampreias com peças bucais especializadas para retirar a carne de suas vítimas, representando a evolução desses animais em predadores impressionantes.
“Não há outros fósseis de lampreias da era dos dinossauros que preservem seu aparato oral aterrorizante de forma tão clara”, comenta o paleontólogo Tetsuto Miyashita, do Museu Canadense da Natureza, que não participou do novo estudo.
Os fósseis de peixes foram descritos recentemente na revista Nature Communications pelo paleontólogo Feixiang Wu, da Academia Chinesa de Ciências, e seus colegas. Os fósseis delicadamente preservados foram encontrados em rochas com cerca de 160 milhões de anos na província de Liaoning, na China, e representam duas novas espécies. Eles incluem lampreias inteiras preservadas, desde suas bocas em forma de ventosa até as pontas de suas caudas.

A lampreia jurássica Yanliaomyzon occisor tinha peças bucais semelhantes às da lampreia-bolsa viva, dos dias atuais.
“Fiquei profundamente impressionado à primeira vista”, afirma Wu, especialmente com a preservação das bocas e dos dentes. Os fósseis foram encontrados em rochas que se formaram entre lagos pré-históricos.
Os paleontólogos geralmente não conseguem examinar lampreias pré-históricas com tantos detalhes. Apesar de existirem há mais de 360 milhões de anos, as fósseis de lampreias antigas são difíceis de encontrar. “O registro fóssil das lampreias é muito escasso e pobre”, diz Miyashita, com espécies principalmente pequenas, com apenas alguns centímetros de comprimento, conhecidas dos primeiros duzentos milhões de anos de sua história.
Os especialistas não têm certeza do que as primeiras lampreias se alimentavam, se eram presas pequenas ou mesmo algas, mas elas não tinham as partes bucais especializadas para se alimentar do sangue ou da carne de outros peixes. Os novos fósseis contribuem substancialmente para o registro fóssil desses animais e fornecem novas pistas sobre como esses animais evoluíram.
A maior das duas novas espécies, Yanliaomyzon occisor, tinha mais de 60 cm de comprimento, tornando-a a maior lampreia fóssil já descoberta, aproximadamente do tamanho das maiores lampreias vivas. O peixe era muitas vezes maior do que seus primos anteriores — e seus dentes afiados fornecem uma pista sobre o que impulsionou esse aumento de tamanho.
“As lampreias modernas são parasitas ou não parasitas quando adultas”, diz Miyashita. O tamanho do Yanliaomyzon se encaixa melhor com as espécies parasitas grandes conhecidas hoje, que geralmente se alimentam de peixes ósseos como trutas e bagres. Esses fósseis representam a ocorrência mais antiga conhecida desse estilo de vida peculiar.
Os fósseis de Yanliaomyzon têm bocas cheias de dentes afiados e uma estrutura especializada chamada cartilagem pistão para mover a língua do peixe, explica Wu, que se assemelha à de uma espécie viva que se alimenta de carne chamada lampreia-bolsa.
Há 160 milhões de anos, as lampreias eram maiores do que nunca, nadando ativamente atrás de peixes para arrancar a carne de suas presas como colheres de sorvete vivas.
Um dos novos fósseis de Yanliaomyzon inclui até fragmentos de esqueleto preservados em seu intestino, indicando que ele arrancava pedaços de suas presas que viravam refeições, arrancando até os ossos. Se as lampreias fósseis tivessem capacidades semelhantes às lampreias-bolsa atuais, escrevem Wu e seus colegas, o Yanliaomyzon poderia até mesmo ter sido capaz de destruir os crânios de suas presas-peixes.
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A evolução das lampreias
Uma mudança nas refeições disponíveis pode ter aberto o caminho evolutivo para as lampreias carnívoras. Os primeiros desses animais coexistiam com peixes maiores, cobertos por uma espessa armadura corporal que as minúsculas lampreias não seriam capazes de penetrar.
Mas, há 160 milhões de anos, afirma Wu, “peixes ósseos com escamas finas começaram a surgir em abundância” e forneceram às lampreias uma nova fonte de alimento. Os peixes escorregadios começaram a evoluir para caçadores proficientes, e os novos fósseis sugerem que as espécies sugadoras de sangue atuais evoluíram de ancestrais carnívoros.
Esses novos fósseis encontrados também estabelecem quando as lampreias desenvolveram um ciclo de vida em várias etapas. Ambas as espécies de Yanliaomyzon têm barbatanas longas em forma de fita na parte inferior, segundo Wu e seus colegas, uma característica associada à natação em águas correntes.
Isso pode indicar que o Yanliaomyzon se comportava de maneira semelhante às espécies modernas de lampreias, com os adultos nadando rio acima em águas doces para depositar seus filhotes. Os filhotes teriam começado suas vidas como filtradores em água doce antes de finalmente seguirem para o oceano para caçar e começar o ciclo novamente.
Fósseis adicionais poderiam elucidar ainda mais as grandes mudanças pelas quais as lampreias passaram desde seus primórdios como pequenos peixes em um mundo de nadadores blindados. “O registro fóssil das lampreias, em comparação com os registros de outros grupos de vertebrados, deve estar entre os menos completos”, revela o paleontólogo Michael Coates, da Universidade de Chicago, Estados Unidos, que não participou do estudo.
Os novos fósseis são um “material fascinante”, observa ele, fornecendo uma riqueza de novas informações sobre um grupo de animais antigos que é conhecido principalmente por apenas algumas partes isoladas da boca. Agora está claro que, no período jurássico, as lampreias haviam desenvolvido uma mordida impressionante.
